O historiador francês François Hartog traz em seu livro “Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo” a noção do que ele chama de regimes de historicidade. Vamos fazer uma introdução sobre o conceito. Antes, porém é necessário relembrar alguns pontos.
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Conceito
Antes de tudo devemos ter em mente que as relações sociais sobre o tempo são pouco questionadas, inferidas ou mesmo negociadas. E sobretudo a naturalização do tempo ao longo da história. Partindo de Homero no mundo antigo segundo Hartog – onde para o pensador grego o tempo histórico era resultado de injustiça até a sua retaliação – passando por Agostinho – com a sua visão teológica ancorada na proposição das 7 eras históricas relativos aos 7 dias que Deus teria levado para construir o mundo, segundo a narrativa do Gênesis – se encontrando com o evolucionismo do século XIX, onde a Arqueologia e a Antropologia Física também deram sua contribuição a naturalização do tempo que a história de nossa espécie tem milhões de anos (primeiros hominídeos), e não os modestos 7 mil anos do Gênesis chegando a história atual com a quebra de estabilidade da nossa relação com o tempo devido à Queda do Muro de Berlim e a derrota do Comunismo sem falar na ampliação dos fundamentalismos islâmicos.
Desta forma a concepção de tempo antes naturalizada agora foi colocada em questionamento tanto no Ocidente como Oriente. Para Hartog não existe mais como definir com precisão o ontem, o hoje e o anteontem. O traumático século XX rompeu com tudo isso. Já o profissional de história tem na sua mente o tempo tão natural, que ele naturaliza a sua ferramenta de trabalho, entretanto o autor diz que a historiografia tem discutido essa naturalização.
Em meio a toda essa complexidade o que vem a ser um regime de historicidade proposto por Hartog? O autor responde que há dois modos de entender: o primeiro modo mais restrito seria como determinada sociedade trata o seu passado e do seu passado, e no segundo modo de forma mais ampla como um nível de consciência própria de uma sociedade.
HARTOG, 2015, p. 28
Com efeito, é uma modalidade de experimentar o tempo e também uma ferramenta heurística para períodos de crise no tempo, como a crise temporal atual. Contudo o historiador francês nos lembra que é um conceito formulado a partir do nosso contemporâneo.
Quais seriam as vantagens e as contribuições para as ciências humanas? Em primeiro lugar não é uma Filosofia da história e mesmo uma Cronosofia, isto é, a junção de profecias com periodizações, representados por Agostinho, Marx, Spengler e Fukuyama só para citar alguns. Não invoca qualquer ligação concreta entre passado, presente e futuro é verdade, ou nas palavras de Jacques Revel o regime de historicidade seria um conceito frouxo, o que não é um fato ruim nas ciências humanas, ao pensarmos na história das “mentalidades” dimensão consagrada na historiografia com os Annales. Em segundo lugar não podemos esquecer que o regime de historicidade nos permite discutir nossa relação com o tempo. Além de abrir a possibilidade de discutir o embate entre história e memória.
O tempo por três séculos foi algo impensável na ciência histórica, foi o recalque para Hartog, o regime de historicidade propõe ir além. Existe outra questão que podemos pensar numa análise mais profunda aos termos noção que de um lado temos o regime de historicidade do historiador e do outro lado o regime de historicidade do objeto pesquisado.
Finalmente, muitos jovens em nosso país, não cresceram sob um regime socialista ou num mundo em ruptura conforme o exemplo do muro de Berlim apresentado por Hartog, mas sim um país que seguiu uma política liberal moderada, misturando aspectos do neoliberalismo e do liberal-desenvolvimentismo. Cresceram sob a nuvem da estabilidade e da inflação controlada, do Brasil que crescia economicamente e que se projetava como potência num futuro breve. De repente em um curto período de tempo o nosso “muro de Berlim” apareceu e o mundo que estávamos acostumados desabou. Então fica a pergunta é qual é o nosso regime de historicidade?